Caminho de Humanidade...

Há um caminho...
Nesse caminho encontramos amores e dissabores,
Nele não há certezas e honras.
Nesse caminho há apenas a vontade certa de penetrar o incerto, mergulhar no mistério e envolver-se pela contemplação de eternidade...
Ah... que eternidade!
A eternidade dos simples que se fazem no tempo.
O tempo dos fracos que se fortificam nos sonhos...
A vida vivida dos que comigo partilham a esperança...
E de repente, no caminho, jaz apenas o encontro: entre o EU que em mim centelha e o TU que em ti contemplo...
Caminhando, enfim, encontro com aqueles que aceitam ser simples; com aqueles que, sendo simples, tornam-se grandes e, sendo grandes, tornam-se detentores de uma sublime humanidade...




Não existe amor maior...

Não existe amor maior...
De repente a gente descobre que não pode mais estar sozinho... que nem a incompletude nossa é capaz de conformar-nos com a ausência de quem nos completa... E então a gente descobre que não pode viver sem o encanto, o carinho, a presença, o amor que Deus nos presenteia...

O que significa ser mestre...

O que significa ser mestre...
Neste dia, a maestria se fez presente na singeleza dos gestos e na simplicidade de quem é sábio na inteireza... de quem é inteiro na sabedoria e humanidade.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

VALORES SOCIAIS

- PARTE  I -

DESCOBRINDO OS VALORES



- O ser humano está sempre avaliando – Avaliar: identificar, reconhecer e aprecisar o valor.
- Reflexão em duas partes: abordagem conceitual e algumas questões  sobre a teoria dos valores (ou axiologia).

1.      Juízos de valor

Juízos de Realidade
Juízos de Valor
Avaliação
Aquela caneta é azul
A caneta azul não é tão bonita quanto a vermelha
Estética
Este lápis é novo
O lápis velho escrevia melhor que este novo
Utilidade
Maria acabou de sair
Maria não deveria ter saído antes de terminar o trabalho
Moral
Pedro foi comprar pão
O pão está muito caro
Econômico
A barraca está cheia de frutas
As frutas  fazem bem à saúde
Vital
João está orando
Orar reconforta o espírito
Religioso


- a palavra Valor:
etimológico -“valere” – “ser forte, valoroso, eficaz” e “ter saúde”.
psicológico“mérito” – talento de alguém ou à coragem de um valoroso guerreiro.
utilidade quando uma faca perde o corte, dizemos que ela não vale nada.

2.      O que são valores

 - Valorar é uma experiência fundamentalmente humana que se encontra no centro de toda escolha.
- O objetivo de qualquer valoração é, sem dúvida, orientar a ação prática.
- Diante do que é, a valoração nos orienta para o que deve ser.
- Mas o que é o valor?

Existe o mundo das coisas e o mundo dos valores. Não podemos afirmar, porém, que os valores
São da mesma maneira que as coisas são, porque o valor é sempre uma relação entre o
 sujeito que valora e o objeto que é valorado; por isso, não há
 valor em si’, mas ‘valor para alguém

Caixa de texto: “uma coisa é valor e outra coisa é ser. Quando dizemos  de algo que vale, não dizemos nada do ser, mas dizemos que não é indiferente. (...) A não-indiferença é a essência do valer” (García Morente)





- Os valores existem na ordem da afetividade, uma vez que não ficamos indiferentes diante de alguma coisa ou de uma pessoa, mas sempre somos afetados por elas de algum modo.       
- Em linhas gerais: os filósofos definem o valor como “o que deve ser objeto de referência ou de escolha” ou, ainda, “um valor é o que vale; e valer é ser desejável ou desejado”.

3.      De onde vêm os valores?

- Os valores são em parte herdados da cultura, e nossa primeira compreensão da realidade  se funda no solo dos valores da comunidade a que pertencemos.
- As experiências de valorar variam conforme a cultura e a época.
- Apesar das variações, todas as comunidades têm a necessidade formal de regras, modelos, cânones, em todos os setores.
Caixa de texto: Na Idade Média era proibido dissecar cadáveres e, no entanto, as instituições de justiça torturavam seres humanos. Naquela época também era pecado emprestar dinheiro a juros, o que hoje os bancos fazem sem nenhuma penitência. Nosso costume de comer bife escandaliza o hindu, para quem a vaca é um animal sagrado. Em certas tribos matam-se os velhos, bem como as crianças nascidas com algum defeito, procedimento que nos parece de incrível crueldade – mesmo porque nem sempre sabemos que nas comunidades em há escassez de alimentos, os incapazes de produzir são eliminados como peso prejudicial à sobrevivência do grupo.










4.      Educar para os valores

- Mesmo sendo transmitidos os valores, não há como desprezar a capacidade humana de criticar os costumes vigentes e ansiar por novos horizontes de ação.
- A crítica é menos intensa nas sociedades tradicionais, que conservam seus modelos de comportamento por mais tempo; mas é muito forte em época de crise de valores.
- A tendência predominante das pessoas é resistir , buscando a segurança de valores dados e não questionados.
- De igual modo acontece com os valores morais: não nascemos morais, mas devemos nos tornar sujeitos morais.
• a construção de nossa personalidade moral supõe uma descentração – em que superamos o nosso egoísmo, em direção ao reconhecimento do outro como outro-eu.
educação moral: inculcação das normas e estimulação da passagem da heteronomia para a autonomia.
• a discussão dos juízos de valor nos ajudam a buscar as razões que fundamentam nossas escolhas.
- Também não nascemos cidadãos, mas devemos ser educados para a cidadania ativa, comportamento fundamental para o exercício da democracia participativa. Não é fácil desenvolver  a política da igualdade – que estimula a solidariedade, o pluralismo e o respeito pelos direitos humanos.
- Enfim:
            • os valores servem para que a sociedade se humanize, mantenha a sua integridade e se desenvolva.
            • para isso, é necessário a preservação da autonomia na capacidade de valorar.
• existe dois momentos: um em que os valores são herdados e, outro, pessoal e intersubjetivo, de questionamento dos valores, priorizando-os ou procedendo a sua revisão, quando eles deixam de estar a serviço da nossa humanização.


- PARTE II –
A FILOSOFIA DOS VALORES

1.      Axiologia ou filosofia dos valores

- O conceito Valor:
• utilizado como termo técnico na economia política no final do séc. XVIII e início do séc. XIX, ao fazer distinção entre valor de uso e valor de troca.
• mais tarde incorporado à filosofia como um novo ramo: axiologia ou filosofia dos valores.
Caixa de texto: Axiologia: em grego, o substantivo axia significa “preço”, “valor de alguma coisa” e o adjetivo axios é “o que vale”, “quem tem valor de”, “digno de”, “justo”. A axiologia, ou teoria dos valores, reflete sobre o significado do conceito de valor, os chamados juízos de valor, buscando explicitar a natureza e as características do valor.






2.      Concepções axiológicas
- Desde a filosofia antiga, os pensadores abordavam as questões do valor sob o aspecto do bem, do belo, do verdadeiro, mas sempre com relação ao ser -  a discussão não estava centrada no valor, que dependia da metafísica.
  Platão: “mundo das idéias” – modelo no qual a realidade concreta se espelha. Haveria o bem em si, o belo em si e o verdadeiro em si.
Aristóteles: “natureza” – (inclusive a natureza humana) – como um processo em que todos os seres buscam atualizar (tornar atual) aquilo que são em potência, visando à plena natureza.
Kant:Século XVIII, representante do iluminismo alemão – afirma que não podemos conhecer o ser profundo das coisas, concluiu pela incapacidade da razão de ter acesso à metafísica. Como conseqüência, se o ser não é mais o fundamento das nossas apreciações, cabe ao sujeito assumir o peso e a responsabilidade dos seus valores. Kant não se referia a um sujeito individual, mas ao sujeito universal, que ele chama de sujeito transcendental, capaz de autonomia, de julgar por si próprio ao fazer juízos estéticos e morais.
Filósofos que se seguiram: passaram a dar destaque à noção de temporalidade e de vir-a-ser: neste mundo em mudança, que está sempre “por se fazer”, os valores adquirem dimensão própria.
Friedrich Nietzsche: coloca em questão a escala de valores aceita muitas vezes devido ao hábito, mas sobretudo imposta pela tradição cristã.
- humildade, caridade, resignação e piedade são valores dos fracos e vencidos, próprio de uma moral de “escravos”, intimamente ligada às necessidades dos que vivem em rebanho.
- a “moral dos senhores” é positiva, porque baseada no sim à vida, e se configura sob o signo da plenitude, do acréscimo.
- propõe a transvaloração dos valores – eles não existiram desde sempre. Os valores são “humanos, demasiado humanos” e, portanto, foram criados.
- ao criticar o fato de que os valores há mais de dois mil anos se acham fundamentados na metafísica e na religião, considera que a vida é o único critério de avaliação que se impõe por si mesmo.

3.      Relatividade e subjetividade dos valores.

- Seriam os valores relativos e não mais absolutos? Seriam eles subjetivos, e não objetivos e universais?
- Segundo a atitude intelectualista  - pela qual se admite ser a razão que descobre os valores, e não a sensibilidade -, porder-se-ia concluir pela relatividade dos valores. Mas não é bem assim.
- Para outros filósofos, a recusa dos valores dados como eternos e imutáveis não significa cair no relativismo. Vejamos alguns tópicos a respeito do assunto:
• a questão do gosto não pode ser encarada como uma preferência arbitrária e imperiosa  da nossa subjetividade, porque é possível educar a sensibilidade, aprimorando o gosto.
• respeitar as opiniões diferentes não significa  a impossibilidade de discordar delas.
• é possível discutir com os opositores sobre os motivos das escolhas e das rejeições.
- Damos destaque ao esforço pessoal reflexivo, estimulado pelo diálogo, que leva ao esclarecimento dos nossos juízos de valor, bem como ao desenvolvimento da sensibilidade, o que nos permite lançar um outro olhar sobre nossas crenças arraigadas.

Conclusão

- A discussão filosófica sobre valores é importante, porque ela nos proporciona um olhar diferente sobre o mundo e sobre nós mesmos, o que pode resultar num antídoto para a alienação, o conformismo, o preconceito.
- Não podemos deixar de lado o caráter existencial do pensar, que se funda em exigência ética, estética e política.
- Enfim: precisamos dessa reflexão sobre os valores, num mundo excessivamente individualista, pragmático, tecnocrático, em que os meios são mais valorizados do que os fins humanos.
 
           

A QUESTÃO DEMOCRÁTICA



A Sociedade Democrática
Há na prática democrática e nas idéias democráticas uma profundidade e uma verdade muito maiores e superiores ao que a ideologia democrática percebe e deixa perceber.
As eleições, por exemplo, simbolizam o essencial da democracia: que o poder não se identifica com os ocupantes do governo, não lhes pertence, mas é sempre um lugar vazio que os cidadãos, periodicamente, preenchem com um representante, e podem revogar seu mandato se não cumprir o que lhe foi delegado para representar.
A sociedade não é uma comunidade uma e indivisa voltada para o bem comum obtido por consenso, mas, ao contrário, que está internamente dividida e que as divisões são legítimas e devem expressar-se publicamente.
A democracia é a única forma política que considera o conflito legítimo e legal, permitindo que ele seja trabalhado politicamente pela própria sociedade.
As idéias de igualdade e liberdade como direitos civis dos cidadãos significam que os cidadãos são sujeitos de direitos e que, onde tais direitos não existam nem estejam garantidos, tem-se o direito de lutar por eles e de exigi-los. É esse o cerne da democracia.
Há uma ênfase na diferença entre necessidade e interesse e direito.
Necessidade
É algo particular ou específico. Há tantas necessidades quanto indivíduos, tantas carências quanto grupos sociais. Necessidades ou carências podem ser conflitantes (resolver umas às vezes tendo que abandonar a outras).
Interesse
Também é algo particular e específico. Interesses também podem ser conflitantes.
Direito
Um direito, ao contrário de necessidades, carências e interesses, não é particular e específico, mas geral e universal. Ex: a carência de  de água e de comida expressa algo mais profundo: o direito à vida.

Dizemos que uma sociedade – e não um simples regime de governo – é democrática quando, além de eleições, partidos políticos, divisão dos três poderes da república, respeito à vontade da maioria e das minorias, institui algo mais profundo, que é a condição do próprio regime político, ou seja, quando institui direitos.

A criação de direitos
A democracia foi criada pelos atenienses. Criou-se também a tradição democrática como instituição de três direitos fundamentais que definiam o cidadão: igualdade, liberdade e participação no poder.
Igualdade
• significava: todos os cidadãos possuem os mesmos direitos e devem ser tratados da mesma maneira perante as leis e os costumes da pólis.
• Aristóteles: a primeira tarefa da justiça era igualar os desiguais.
• Marx:  a igualdade só se tornaria um direito concreto quando não houvesse escravos, servos e assalariados explorados.
• Marx e Aristóteles: a mera declaração de igualdade  não faz existir os iguais, mas abre o campo para a criação da igualdade.
Liberdade
• significava: todo cidadão tem o direito de expor em público seus interesses e suas opiniões, vê-los debatidos pelos demais e aprovados ou rejeitados pela maioria, e deve acatar a decisão tomada publicamente.
• ampliação do direito à liberdade: Revoluções: inglesa, 1644; Francesa, 1789.
• liberdade de pensamento e de expressão, livre escolha do ofício, local de moradia, o tipo de educação, cônjuge – recusa das hierarquias fixas, supostamente divinas ou naturais.
Participação no poder
• significava: todos os cidadãos têm o direito de participar das discussões e deliberações públicas da pólis, votando ou revogando decisões.
• todos os cidadãos têm competência para opinar e decidir, pois a política não é uma questão técnica (eficácia administrativa e militar) nem científica (conhecimentos especializados sobre administração e guerra), mas uma ação coletiva, isto é, decisão coletiva sobre os interesses e direitos da própria pólis.

Ampliando a participação
A democracia ateniense era direta. A moderna, porém, é representativa. O direito à participação tornou-se indireto, por meio da escolha de representantes. Ao contrário dos outros dois direitos, este último parece ter sofrido diminuição mais que ampliação (afirmação verdadeira e falsa):
verdadeira: porque a república liberal tinha a tendência de limitar os direitos políticos aos proprietários privados dos meios de produção e aos profissionais liberais da classe média, aos homens adultos “independentes”.
falsa: porque a democracia moderna foi instituída na luta contra o Antigo Regime, ampliando a participação dos cidadãos ainda que sob a forma de representação.
As lutas socialistas e populares: forçaram a ampliação dos direitos políticos com a crianção do sufrágio universal (todos são cidadãos eleitores: homens, mulheres, jovens, negros, analfabetos, trabalhadores, índios) e a garantia da elegibilidade de qualquer um que, não estando sob  suspeita de crime, se apresente para um cargo eletivo.
As lutas por igualdade e liberdade ampliaram os direitos políticos (civis) e, a partir destes, criaram os direitos sociais – trabalho, moradia, saúde, transporte, educação, lazer, cultura -, os direitos  das chamadas “minorias” – mulheres, idosos, negros, homossexuais, crianças, índios – e o direito à segurança plenetária – as lutas ecológicas e contra as armas nucleares.

Traços da democracia
A sociedade democrática institui direitos pela abertura do campo social à criação de direitos reais à ampliação de direitos existentes e à criação de novos direitos. Dois traços distinguem a democracia de todas as outras formas sociais e políticas:
1.      A democracia é a única sociedade e o único regime político que considera o conflito legítimo (contrapoder social – que direta ou indiretamente limita o poder do Estado;
2.      A democracia é a sociedade verdadeiramente histórica, isto é, aberta ao tempo, ao possível, às transformações e ao novo.
Pela criação de novos direitos e pela existência de contrapoderes sociais, a sociedade democrática não está fixada numa forma para sempre determinada, ou seja, não cessa de trabalhar suas divisões e diferenças internas, de orientar-se pela possibilidade objetiva (a liberdade) e de alterar-se pela própria práxis.

Obstáculos à Democracia
Liberdade, igualdade e participação conduziram à célebre formulação da política democrática como “governo do povo, pelo povo e para o povo”. Entretanto, o povo está dividido em classes sociais – seja os ricos e os pobres (Aristóteles), os grandes e o povo (Maquiavel), seja as classes sociais antagônicas (Marx).
A sociedade democrática não esconde suas divisões, mas procura trabalhá-las pelas instituições e pelas leis.
No capitalismo, são imensos os obstáculos: o conflito de interesses é criado pela exploração de uma classe social por outra, mesmo que a ideologia afirme que todos são livres e iguais.
As lutas populares nos países de capitalismo avançado ampliaram os direitos dos cidadãos e a diminuição da exploração dos trabalhadores – Estado do Bem-Estar Social.
Um preço a pagar: a exploração mais violenta do trabalho pelo capital recaiu nas costas dos trabalhadores dos países desenvolvidos – divisão internacional do trabalho e da exploração.
Estado do Bem-Estar Social

Características da economia política que sustentava o Estado de Bem-Estar Social:
1.        o fordismo na produção – controle da organização do trabalho, da produção de grandes estoques e dos preços mediante o planejamento e a chamada “gerência científica”.
2.        A inclusão crescente dos indivíduos no mundo trabalho, orientando-se pela ideia de p leno emprego.
3.        Monopólio e oligorpólio que, embora transnacionais ou multinacionais, tinham como referência reguladora o Estado nacional. Para que essa economia realizasse o bem-estar foi preciso que o Estado interviesse nela como regulador ou parceiro.


Fragilidade nos dias atuais – mudança profunda no modo de produção capitalista a partir do momento em que o modo de produção capitalista passou a enfrentar a crise do Estado do Bem-Estar Social recorrendo ao neoliberalismo e à ideia liberal de autocontrole da economia pelo mercado capitalista, afastando a presença do Estado do plamejamento econômico e da aplicação dos fundos públicos ára a garantia de direitos sociais.
Neoliberalismo

É uma teoria econômico-política formulada por um grupo de economistas, cientistas políticos e filósofos que se opunha ao surgimento do Estado de Bem-Estar Social. Navegando contra a corrente das décadas 1950 e 1960, esse grupo elaborou um detalhado projeto econômico e político que atacava o Estado do Bem-Estar Social com seus encargos sociais e com a função de regulador das atividades do mercado. Afirmava que esse tipo de experiência destruía a liberdade dos cidadãos e a competição, sem as quais não há prosperidade.

Abandono das políticas sociais ►privatização.
Abandono do planejamento econômico►desregulação.


Os direitos econômicos e sociais conquistados pelas lutas populares correm perigo por causa da privatização, do encolhimento da esfera pública e do alargamento da esfera dos interesses privados.


Uma definição mínima de democracia


[...] No entanto, mesmo para uma definição mínima de democracia, como é a que aceito, não bastam nem a atribuição a um elevado número de cidadãos no direito de participar direta ou indiretamente da tomada de decisões coletivas, nem a existência de regras de procedimento como a da maioria [ou, no limite da unanimidade]. É indispensável uma terceira condição: é preciso que aqueles que são chamados a decidir ou a eleger os que deverão decidir sejam colocados diante de alternativas reais e postos em condição de poder escolher entre uma e outra. Para que se realize esta condição é necessário que aos chamados a decidir sejam garantidos os assim denominados direitos de liberdade, de opinião, de expressão das próprias opiniões, de reunião, de associação, etc. – os direitos à base dos quais nasceu o Estado liberal e foi construída a doutrina do Estado de direito em sentido forte, isto é, do Estado que não apenas exerce o poder sub lege, mas o exerce dentro de limites derivados do reconhecimento constitucional dos direitos “invioláveis” do indivíduo. Seja qual for o fundamento filosófico destes direitos, eles são o pressuposto necessário para o correto funcionamento dos próprios mecanismos predominantemente procedimentais que caracterizam um regime democrático. As normas constitucionais que atribuem estes direitos não são exatamente regras do jogo: são regras preliminares que permitem o desenrolar do jogo.
Disto segue que o Estado liberal é o pressuposto não só histórico mas jurídico do Estado democrático. Estado liberal e Estado democrático são interdependentes em dois modos: na direção que vai do liberalismo à democracia, no sentido que são necessárias certas liberdades para o exercício correto do poder democrático, e na direção oposta que vai da democracia ao liberalismo, no sentido de que é necessário o poder democrático para garantir a existência e a persistência das liberdades fundamentais.  Em outras palavras: é pouco provável que um estado não-liberal possa assegurar um correto funcionamento da democracia, e de outra parte é pouco provável que um Estado não-democrático seja capaz de garantir as liberdades fundamentais. A prova histórica desta interdependência está no fato de que o Estado liberal e o estado democrático, quando caem, caem juntos”.
(BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia. Tradução de Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 32-33).
_________
CHAUÍ, Marilena. Filosofia. Série novo Ensino Mèdio. Volume único. São Paulo: Ática p. 270-278.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Deus

Há algum tempo o ser humano imaginou ter alcançado a arte definitiva de ser Deus. É interessante que quanto mais as pessoas negam a existência de Deus, só conseguem fazê-lo afirmando-O. Negam um Ser denominado de Deus, mas afirmam-se detentores da condição de serem deuses.

Não é uma atitude apenas contemporânea. Sempre foi assim. Desde a Antiguidade, passando pela Idade Medieval, época em que aparentemente Deus se fez bastante presente, chegando à Modernidade, tempo em que a ciência se afirmou fortemente como "deusa" da história, os homens e mulheres não baixaram a guarda quanto à possibilidade de colocar Deus sempre a serviço dos objetivos humanos.

A afirmação do ser humano parece estar sempre acompanhada da necessidade quase que antropológica de desbancar um ser que possa ser superior a si. Esse ser reclama para si muito poder. Não é típico do ser humano querer partilhar a história. Não é próprio da humanidade imaginar o transcendente fora do alcance da sua imanência.

Por isso, é muito mais fácil negá-Lo do que afirmá-Lo. É muito mais fácil provarmos a sua inexistência do que propriamente a sua imanência, a sua presença.

Aí então, entramos em um plano que já não é da lógica positivista ou cientificista que assola o presente da humanidade. Entramos no plano da Transcendência, da Fé. Trata-se de um plano que tem o intuito de afirmar mais o humano do que negá-lo, mesmo sabendo que o ser humano, ao negar a Deus, não quer negá-Lo, mas quer afirmá-Lo "fora" do seu caminho...

Assim, a Transcendência é esta capacidade que temos em não negar o que há além de nós, mas reconhecer que podemos alcançar realidade que por justamente irem além de nós, complementam o que somos, completam o nosso jeito humano de existir.

A Fé é uma das formas de Transcendência. Uma das formas que encontramos de alcançar, não somente a Deus, mas todas as realidades que, pela força de serem além do que somos, colocam-nos no âmbito próprio do entendimento do que realmente somos, do que realmente podemos ser.